quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Pio Penna Filho comenta a guerra civil na Síria


 Ingerências externas e guerra civil

 
Pio Penna Filho
A situação está fora de controle na Síria. O governo não consegue mais dominar partes importantes do seu território e as ingerências externas são cada vez mais intensas, o que torna o quadro político ainda mais instável. Do ponto de vista militar, o governo ainda dispõe de força suficiente para conter o avanço dos rebeldes, prorrogando o seu previsível fim e prolongando o sofrimento de todos.
Todavia, o suporte político ao governo que vem do exterior parece diminuir à proporção que cresce o avanço dos insurgentes e que se amplia a propaganda internacional contra o regime.
A queda de Bashar al Assad é uma questão de tempo. Se por um lado é impossível prever com precisão quando será a sua queda, se em questão de semanas ou meses, por outro é possível afirmar, sem medo de errar, que o seu fim se aproxima a passos largos.
No plano externo os aliados que restaram do governo sírio estão sofrendo uma pressão crescente da comunidade internacional. São poucos os países que ainda apoiam, de alguma forma, o governo de Assad. Dentre eles se destaca a Rússia, aliada há décadas da Síria na geopolítica do Oriente Médio. Outros dois países de destaque são a China e o Irã. Essa tríade atua por interesses próprios que nem sempre convergem, ou seja, não há um único argumento que justifique a sua atuação.
De toda forma, é um apoio nada desprezível e muito eficaz. A China e a Rússia são membros plenos com direito a veto no Conselho de Segurança das Nações Unidas e até agora bloquearam todas as tentativas de impor sanções ou autorizar o uso oficial da força contra Damasco. Aliás, a título de exemplo, o uso da força foi decisivo para o fim do regime de Kaddafi na Líbia. Já o Irã mantem suporte material e de tropas especiais em território sírio, auxiliando, mesmo que modestamente, o esforço do governo para tentar controlar a insurgência.
 
Mas no exterior existe também uma considerável rede de apoio aos rebeldes sírios. Estados Unidos, os membros da União Europeia, Catar, Arábia Saudita e Turquia são aqueles que mais se destacam. Ninguém faz guerra sem dinheiro e sem armas e todo o arsenal que vem sendo utilizado pelos insurgentes sírios não foi conseguido apenas tomando esses recursos do Exército. Armas, munição, dinheiro e assistência técnica “especializada” foram enviados de fora para a Síria.
Os Estados Unidos, mesmo que discretamente, estão particularmente envolvidos na política síria e desejam, confessadamente, a queda de Assad. Há fortes evidências da atuação da CIA na Síria e o governo americano já disponibilizou cerca de 20 milhões de dólares para os rebeldes. Vale destacar, porém, que esse valor é irrisório diante do que está por vir.
A Síria é um país complexo e a transição de poder não será nada fácil. Algumas diferenças étnicas e religiosas estão sendo acentuadas diante do quadro de guerra civil e será muito complicado qualquer arranjo político razoável no imediato pós-guerra.
Do ponto de vista militar, outra enorme preocupação é o que acontecerá com as armas químicas do país. Existe o temor de que o governo repasse pelo menos parte do seu arsenal para o Hezbollah, o que para Israel é intolerável e por demais ameaçador. Infelizmente o conflito na Síria ainda está longe do fim.

 
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Professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do CNPq. E-mail: piopenna@gmail.com

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