A Vez da Espanha
Pio
Penna Filho*
Existem certos comportamentos que são
intrigantes. Essa semana o embaixador espanhol no Brasil, Manuel de la Cámara,
reclamou que os seus patrícios estão encontrando uma série de dificuldades para
conseguir vistos de trabalho para o Brasil. Ora, pois, soa até engraçado, senão
vergonhoso, que justamente o representante da Espanha nos venha com essa
reivindicação.
De acordo com o Itamaraty, a Espanha barrou,
apenas em 2011, 1.402 brasileiros que tentaram entrar ou passar pelo país.
Viajar para a Espanha, ou mesmo passar pela Espanha, virou um grande desafio
para os brasileiros nos últimos anos. Aliás, para alguns um verdadeiro
martírio.
As autoridades espanholas não mediam esforços
para colocar restrições foram tomadas medidas draconianas com o único objetivo
de dificultar o trânsito ou a entrada de brasileiros no país ibérico. E não vale
dizer que era uma regra europeia, haja vista que não temos registro de tantas
dificuldades e arbitrariedades em outros países europeus.
Na Europa, comparável à Espanha, apenas Portugal
colocava tantos empecilhos para a entrada de brasileiros. Por ironia da
história, esses dois países ibéricos estão hoje diante de uma crise de grandes
proporções e querem, agora, um tratamento “digno” e facilitado para os seus
cidadãos acessarem o mercado brasileiro.
Voltando ao caso espanhol, vale lembrar e
destacar que o simples trânsito de brasileiros pelo país era motivo de grande
apreensão. Não foram poucos os casos de abusos de autoridades espanholas que
deixavam pessoas detidas por vários dias no aeroporto de Barajas.
A Espanha é um país soberano e tem todo o direito
de determinar quem pode ou não entrar em seu território, quem é ou não
desejável. O que argumento nesse artigo é que os espanhóis deveriam ser, pelo
menos, um pouco mais coerentes. Se optaram por uma política imigratória
excludente e discriminatória para com os brasileiros, não deveriam ficar agora
reclamando das dificuldades de obtenção de vistos no Brasil para os seus jovens
e, aparentemente, desiludidos jovens.
Quando a opinião pública brasileira pressionou o
governo e fez o Itamaraty se movimentar, os espanhóis não demonstraram tanto
interesse assim em solucionar o problema. As reuniões de alto nível, quando
aconteciam, não resultavam em avanços concretos. Nisso, ficou evidente também a
falta de interesse do Itamaraty em pressionar com mais determinação a Espanha.
O problema acabou sendo encaminhado mais pela desistência das pessoas em ir
para a Espanha do que por iniciativas diplomáticas brasileiras.
Foi somente após o governo brasileiro, sob
pressão da sociedade, anunciar medidas de reciprocidade e depois
de algumas deportações que a Espanha se sensibilizou para o assunto e decidiu
flexibilizar as regras para a admissão de brasileiros em seu território. Mesmo
assim essa medida veio tarde demais.
Diante das reivindicações espanholas é bem
possível que o nosso Ministério das Relações Exteriores resolva ceder e revisar
as regras para a entrada de espanhóis no país, flexibilizando-a. É uma
vergonha, mas infelizmente não podemos esperar muito do Itamaraty quando o
assunto diz respeito aos países europeus. Fosse a Espanha um país africano, por
exemplo, e certamente não haveria piedade.
*Professor do Instituto de
Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do
CNPq. E-mail: piopenna@gmail.com
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