A Inglaterra e a União Europeia
Pio Penna Filho
O primeiro
ministro britânico, David Cameron, anunciou que se for reconduzido ao cargo
fará um plebiscito para consultar a população britânica sobre a conveniência do
país permanecer ou não na União Europeia. Foi um pronunciamento para lá de
polêmico, que irritou alguns britânicos e, mais ainda, outras lideranças europeias.
Em tempos de crise na Europa, revive-se
um antigo sentimento britânico de que manter-se um pouco distante do continente
faz muito bem para a economia e para a política britânica. Pelo menos esse foi
o padrão histórico do relacionamento entre os britânicos e os europeus
continentais.
A Inglaterra, historicamente,
se beneficiou de sua ambiguidade de ser ao mesmo tempo europeia e universal. O
seu caráter insular lhe garantia o devido distanciamento e proteção natural, reforçada
por uma poderosa marinha de guerra, contra os tumultos políticos muito
recorrentes na história da Europa desde pelo menos o início da idade moderna
até o final da Segunda Guerra Mundial.
Não foi por
acaso que a adesão da Inglaterra à Comunidade Europeia tenha demorado alguns
anos para acontecer desde que foi criado o Mercado Comum Europeu. Sua não
adesão ao Euro é outro sintoma do sentimento mais nacionalista dos ingleses que,
usualmente, são muito pragmáticos e olham com certa desconfiança para os
arranjos políticos do continente.
Hoje, num
cenário de crise econômica e com a sua economia bastante atrelada ao continente,
algumas lideranças políticas inglesas veem com desconfiança as decisões
econômicas tomadas no âmbito da União Europeia. O sentimento dessas lideranças
é que os compromissos comunitários limitam a capacidade de autonomia do governo
britânico, impedindo-o de ações setoriais que eventualmente possam promover uma
recuperação econômica mais rápida.
A reação ao
pronunciamento de Cameron foi intensa na Europa. O ministro das relações
exteriores da França chegou a ironizar dizendo que, por ele, se deveria
estender um tapete vermelho para a retirada da Inglaterra. Já o premiê italiano
demonstrou irritação com a posição de Cameron, considerando-a mesmo contrária
ao sentimento da maior parte dos britânicos.
De fato, a
situação política na Europa ficou um tanto comprometida após a persistente
crise econômica iniciada em 2008. O brutal estrangulamento das economias da
Grécia, de Portugal e a situação crítica da Espanha, em termos sociais e
econômicos, está produzindo muita tensão entre algumas lideranças e setores
sociais organizados, que reclamam da condução quase draconiana da política
monetária exercida pela Alemanha e secundada pela França, as duas mais
importantes economias continentais.
Talvez um dos
grandes paradoxos do início dessa discussão na Inglaterra seja o fato de que, no
outro extremo, existem vários países batalhando pela entrada na União Europeia,
apesar da crise. De toda forma, mesmo sendo muito difícil prever o que poderá
acontecer num eventual plebiscito britânico, a sua ideia, por si só, já é um
indicativo de que as coisas não vão muito bem no velho mundo.
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Professor do Instituto de
Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do CNPq.
E-mail: piopenna@gmail.com
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