quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Pio Penna Filho aborda a perseguição a Julian Assange


Perseguição a Julian Assange
 
Pio Penna Filho*

 
O anúncio de que o governo do Equador concedeu asilo político a Julian Assange causou uma reação intempestiva do governo britânico, que vem ameaçando inclusive invadir a representação diplomática equatoriana em Londres para prender Assange e depois extraditá-lo para a Suécia, provavelmente primeiro estágio antes de seu destino final, que seria algum cárcere norte-americano.
A ameaça britânica, pelo menos como divulgada pela imprensa, é um fato realmente grave que compromete o tradicional conceito de inviolabilidade das missões diplomáticas, garantido pela Convenção de Viena, e o direito ao asilo territorial, consagrado pela prática diplomática latino-americana e geralmente respeitado por vários outros países.
É verdade que Julian Assange, com a divulgação de muitos segredos de Estado e indiscrições diplomáticas revelados por meio do WikiLeaks, incomodou muitos governos e muita gente, sobretudo o governo norte-americano. Os Estados Unidos, não é de hoje, estão loucos para agarrar Assange e, se possível, condená-lo à morte ou à prisão perpétua.
Sua extradição para a Suécia poderia ser um passo importante para que os Estados Unidos lograssem alcançar a sua meta e foi justamente por essa razão que Assange buscou asilo na embaixada do Equador em Londres. Vale lembrar que nos Estados Unidos as acusações contra Assange são secretas, o que gera uma situação de verdadeira impotência da defesa de Assange diante das garras do Estado.
 
Parece surreal mas o que pode acontecer é que a democracia britânica talvez faça o que nem a mais terrível das ditaduras latino-americanas ousou fazer durante o tenebroso período militar, ou seja, violar o espaço de uma missão diplomática e prender um asilado político.
Curioso é que durante o golpe militar no Chile, em 1973, cerca de cinco mil pessoas foram beneficiadas pelo direito de asilo e salvaram-se ao se abrigarem em representações diplomáticas em Santiago, capital do país. Aliás, as embaixadas europeias estavam entre as mais buscadas pelos militantes políticos em apuros. Naquela ocasião, nem a então Junta Militar e, depois, nem o presidente general Augusto Pinochet, impediram a saída dos asilados políticos do país. O mesmo ocorreu no Brasil, na Argentina, no Uruguai, enfim, em todos os países que caíram sob regimes ditatoriais.
Já a democracia britânica do século XXI acha normal que uma pessoa seja perseguida porque divulgou “segredos militares” e confidências diplomáticas dos Estados Unidos. Aliás, os segredos militares divulgados pelo WikiLeaks apenas mostram a brutal realidade da guerra e da ação dos Estados Unidos no Iraque e no Afeganistão. Enfim, apenas comprovam o que muita gente sabia mas não tinha como provar.
É preciso uma reação ao desatino das autoridades britânicas. Como bem disse o chanceler equatoriano, Ricardo Patiño, o seu país não é uma colônia britânica. Os países latino-americanos, por sua tradição jurídica em termos de reconhecimento do direito de asilo, deveriam se pronunciar oficialmente sobre essa questão e mostrar como os “civilizados” europeus estão se comportando ao desrespeitarem inclusive os direitos humanos.

 
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* Professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do CNPq. E-mail: piopenna@gmail.com

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